E havia também a história da aspirante a princesa que, chamada a dormir no castelo do príncipe casadoiro (tem que ser casadoiro, afinal isso faz um tempão) acordou de manhã reclamando de uma tremenda dor nas costas.
A, ah! Disse alguém, acho que a futura sogra. Eis finalmente uma princesa a quem se lhe possa dar o título! (a linguagem tem que ser essa, já expliquei que faz um tempão). Eu colocara na noite anterior uma ervilha debaixo dos dez colchões da cama e ela a sentiu! Que pele! Que sensibilidade! Eis a futura mulher do meu filho e nora dos meus sonhos!
Bom, a coisa é assim. Mais ou menos, tá, que eu me dou o direito de certas licenças.
Em primeiro lugar, o que prova o fato da moça sentir a ervilha debaixo dos dez colchões? Minha avó, por exemplo, dormia num colchão de algodão e não abria mão disso. Era sempre o mesmo colchão. Eu gostava de tirar uma sonequinha lá, pois não havia nada mais protetor. Depois de quinhentos anos com minha avó dormindo em cima, o colchão tinha a forma do corpo dela, em baixo relevo. Na parte em que ficava provavelmente a bunda – minha avó era bunduda, pena que eu não tenha a mesma genética – dava pra sentir até uma pena, tal a finura do colchão.
Esclarecida essa questão, vemos como nem tudo é o que parece.
Depois, isso de acordar reclamando já não é bom sinal. Normalmente o índice de reclamação piora no decorrer do dia. Agora quem já começa ao nascer do sol, vai mal. Muito mal. O que não será numa festa noturna no palácio?
Sei não, sei não.. Essas histórias infantis são muito esquisitas.
Era eu que tolerava uma sogra botando ervilhas debaixo do meu colchão!
Era eu que sentiria as ervilhas debaixo do meu colchão (nem que fossem melancias)!
Era eu que escolheria pra marido um príncipe tutelado pela rainha-mãe!
Logo eu, que não sou princesa de nada, snif..
Eita historinha infantil mais sem graça!